segunda-feira, 6 de abril de 2009

Quem tem medo de travesti?

Certa vez li um pensamento que dizia: ”Aquilo existente no outro nos incomoda por estar presente em nós. Escondido”. Hoje eu não descarto essa possibilidade.
Quando aceitei o emprego de vigia noturno meu inspetor me disse que eu assistiria coisas que apenas na calada da noite se pode testemunhar.
A duas noites passadas por volta de 03h20min da madrugada minhas retinas já estafavam fatigadas do nada que tomara conta de uma grande avenida em minha cidade, mas um barulho de tamancos quebrou o silêncio. De longe pude avistar uma figura que mais parecia estar trotando do que andando. Uma figura feminina se desvendava a cada segundo. Coloquei-me a olhar para o chão; O barulho parou, um perfume doce (muito enjoativo por sinal) me invadiu e conforme erguia minha cabeça meus olhos iam desvendando cada parte de um belíssimo corpo de mulher: coxas não muito grossas, mas muito bem torneadas, uma cintura que parecia ter sido feita por encomenda e com a calça cintura baixa (baixíssima) tornava-se ainda mais desejável, seios pequenos e rijos e um... Um enorme pomo de adão!Uma “moça” branca de cabelos loiros e lisos até a altura dos cotovelos usava um lápis de olho preto e uma sombra azulada e aparentava ter no máximo 20 anos. Um travesti em pessoa na minha frente!É claro que já havia visto muitos travestis, mas nunca sozinho em uma madrugada. Minha garganta secou na hora e me lembrei de tudo o que já tinha ouvido falar sobre o suposto submundo das “travas”. Travesti, para mim, sempre habitou a boca do lixo da sociedade, lembro que certa vez quando andava com minha madrinha e uma mulher muito alta cruzou a mesma calçada em que estávamos e a minha madrinha segurou forte minha mão. Depois que a tal mulher passou ela me disse no ouvido como quem dá o melhor aviso: ”Cuidado com esse tipo de gente!Aquilo ali era homem e quando você vê um desses na rua não fica olhando!Ela corre atrás de você,gostam de fazer escândalo.Tem navalha na bolsa” .Desse dia em diante quando avistava “um desses na rua” meu olhar ia ao chão!
-Tem fogo ‘seu’ quarda?- sua voz era fanhosa e forçadamente afetada –
-Não! – respondi gaguejando e sem olhar para o seu rosto –
Por mais que tentasse eu não conseguia parar de olhar o seu corpo. Era fabuloso e de um jeito estranho o enorme pomo de Adão era o ingrediente necessário!
-É novo aqui no ponto, né?
-Sou - disse secamente –
-‘Vamu’ trepar?São cinqüenta “meréis”
Seu linguajar espantoso me vez quase cair da cadeira. Estava com um sonoro’não’ saindo pela boca quando ela disse que faria por vinte e cinco reais e maços de cigarro; confesso que a proposta me fez pensar antes de dar a resposta.
Eu disse que ‘não’, mas com um ‘sim’ entalado brigando para sair da toca. Mas não poderia aceitar. A questão do emprego na hora nem pensei; a verdade é que eu estava em uma controversa com meu (perdão pela má palavra) pinto encolhido e medroso diante de um ser cuja figura me prometia um gozo extraordinário.
-Nem um boquete você quer, porra?- essas palavras me fizeram estremecer... De medo-
A verdade é que o travesti é uma incógnita para ele mesmo e antes que você consiga decifrá-lo ele te devora. É estar no limite do prazer com a dor... A Cinderela de repente se torna um “Ricardão viril”.
Com o passar do tempo a conversa foi tomando rumos ora leves, ora pesadíssimos; com jeito espalhafatoso e suas tiradas incríveis consegui dar muitas risadas.O que estava diante de mim não era um monstro a ser temido,mas uma pessoa a ser respeitada.
Ao ir embora ela me deu um beijo no rosto que tratei de retribuir.
-Ah, tenho que voltar pra ‘Z’.
-“Z”?
-A zona, porra!
Com um andar deselegante ao extremo sua imagem foi se apagando na escuridão, mas cerca de 5 minutos depois ela voltou correndo.
-‘Seu’ guarda me “add “ no “Orkut’s”?

No caminho de volta para minha casa fui pensando: Por que essas pessoas estão condenadas a levar uma vida escrota onde vendem seus corpos por migalhas, não tem sua condição de cidadão comum respeitada?Por que afinal existe, por parte dos travestis, um conformismo irritante de ser a escoria da sociedade onde apenas na calada da noite são livres?Por que não vemos um travesti progredir na vida com trabalhos comuns do tipo ‘carteira assinada’?
A minha resposta é tão simples e complexa quanto um copo de água: Encarando-os de frente,de igual para igual,se importando realmente com as coisas que são cabíveis como caráter.
É claro que essas pessoas precisam ter postura e força de vontade para sair desse estereotipo de vida suja, mas se nós que também somos vidraça em algum ponto da vida e insistirmos em ser uma gigantesca pedra na vida alheia não tivermos no mínimo boa vontade nada mudará.

9 comentários:

  1. com todo respeito a todos que frequentam esse mundão...eu só sei te dizer que CADA UM ESTÁ AONDE SE PÕE.....
    e ainda digo mais OS OUTROS TE TRATAM COMO VOCE SE TRATA....é simples .
    Somos responsáveis pela nossa desgraça ou pela nossa felicidade,quando colocamos culpa em alguem ou em algum fato estamos transferindo o nosso poder ao OUTRO...o poder está em nós!
    Portanto tudo depende exclusivamente da gente,
    os nossos pensamentos ,emoções e atitudes vão ter reações durante a nossa vida.....
    é uma questão de escolha!!


    bjão e parabens pelo post

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  2. Bem que eu queria concordar com a Sandra(comentário acima) ... mas não é possível ignorar a influencia da sociedade!

    Achei muito belo o texto e a sinceridade com que você Rômulo expôe sua vida nessas linhas... É claro que o travesti é enigmático... e que certas posturas psicológicas veem junto no pacote.
    Li uma crônica do Arnaldo Jabor que dizia que o mundo de hoje é travesti:

    "As mulheres sofrem mais com o mal do mundo. Carregam o fardo da dor histórica e social, por serem mais sensíveis e mais fracas. Os homens, por serem fálicos, escamoteiam a depressão e a consciência da morte com obsessões bélicas, financeiras ou políticas. As mulheres agüentam firmes a dor incompreendida. O mundo está tão indeterminado que está ficando feminino, como uma mulher perdida: nunca está onde pensa estar. O mundo determinista se fracionou globalmente, como a mulher. Mas não é o mundo delicado, romântico e fértil da mulher; é um mundo feminino comandado por homens boçais. Talvez seja melhor dizer um mundo travesti. O mundo hoje é travesti."

    Enfim... as aparências sempre tão admiradas estão nas entrelinhas se unindo em um monte da mesma coisa! A diferença está nos olhos de quem vê!

    Aplausos pelo mais belo texto que li por aqui!

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  3. É mais complicado do que parece. Na maioria das vezes não é por opção. Dentre nos os traavestis são menos aveitos e sofrem até mesmo preconceito por parte de gays, lésbicas e bissexuais. São facilmente expulsas de casa e a única opção é a prostituição, casa de boate e tc... algo bem triste. Se a vida é rigifa para nós... para eles é o dobro. Se não nos dão emprego quando nos declaramos gays imagine a eles... coitados. Mas já vi casos de travestis bem sucedidos e eu sempre quis dar um beijo em uma daquelas travestis que realmente se parecem com mulher, rs.

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  4. Gostei do texto Rômulo , achei bem polêmica algumas partes , ele era bem desbocado né? Hoje lembrei de ti no colégio , quando mandaram fazer um texto dissertativo!!!!! saudades tua , ando meio sumido pq a net tá mto ruim!
    te adoro!

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  5. A verdade é que o diferente choca e assusta.
    E travestis são muito diferentes.
    INclusive dentro do mundo gay são discriminados.
    Entretanto, as coisas mudam. Em passos de cágado, mas mudam.
    Li uma reportagem sobre o primeiro travesti brasileiro a concluir um mestrado. Um travesti cearense, da área de educação, que hoje em dia coordena toda uma grande região do nordeste. E é respeitado: por professores, pais e alunos.

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  6. acho que uma das coisas mais importantes a ser combatida é o preconceito que as pessoas sentem por si mesmas. talvez por isso tanta gente simplesmente aceite tudo sem tentar mudar nada.
    mas é complicado mesmo, às vezes simplesmente não há opção... cada caso é um caso =/
    bjo
    teh +
    o/*

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  7. Esse é um daqueles assuntos que a sociedade insiste em fazer vista grossa, finge que não existe, por isso essas pessoas habitam os 'submundos' ... Eu , notívago assumido, vejo muitos travestis pela noite, e alguns são portadores de uma beleza androgena, você realmente não sabe dizer se é homem ou mulher. Certa vez lí um texto falando sobre os travestis e essa questão da androgenidade, e o eu-lirico traçava uma relação com anjos. Claro que é choque pra quem lê, imagina só, comparar criaturas celestiais com Travestis... Enfim, procura o texto que acho que ele pode te trazer pensamentos legais...
    Não que minha vida sexual seja pertinente, mas nunca tive nenhuma relação sexual com qualquer tipo de profissional do ramo, pois sou doador de sangue e também pois isso iria abalar minha auto estima ahhaha.

    Pra fechar o comentário, eu discordo da Sandra. A questão de sermos livres pra escolher o que quisermos, na minha opinião é a maior das mentiras. Todos somos vitimas de um efeito dominó, então mesmo se optarmos por alguma coisa e pensarmos que foi uma escolha sincera, é só pensar um pouco mais que vamos perceber que por tudo que vivemos, nenhuma outra escolha seria mais consequente.
    Abraços

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  8. não é o fato de discordar ou não ...
    é uma questão de sabedoria das LEIS DO UNIVERSO,
    essas leis estão nos regendo mesmo não concordando com ela ....
    A maioria das pessoas vivem sem ao menos conhecê-las...e é claro que vão justificar a sua falta de responsabilidade com a sua vida,pondo a culpa no outro ou no efeito dominó,tanto faz....é um posicionamento vitimista ...fragilizado pela falta de informação...eu entendo....a desculpa é normal e pertinente,esse comportamento existe por milenios de "ignorancia"espiritual(eu digo ignorancia, justificando a ausencia do conhecimento e não no sentido pejorativo) ..eu já fui assim...
    portanto um pouquinho de interesse pela vida como um todo intrinseco,vale a pena o envolvimento...porque quem não se envolve não se desenvolve

    bjo

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  9. Travestis são estranhos, são um dos poucos preconceitos que tenho, às vezes penso que não aceito porque não entendo, um homem que não é totalmente mulher, nem totalmente homem, talvez elas sejam o futuro, talvez sejam a válvula de escape de uma sociedade que tem máscaras para dar em vender, enquanto as travas dão sua cara para bater...
    Sei lá... não vou falar muito, pois não conheço, e se após conhecer, verei se são realmente deuses(as) ou mostros (as)...

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